sexta-feira, 5 de junho de 2009

Será?


É isto mesmo! A comunicação é o veículo para a integração de alguém em qualquer que seja o ambiente. Agora que já consigo ter um diálogo em alemão, muitas portas se abrem para mim. Mas antes de o conseguir, lembro-me que era exactamente isto que sentia. Uma sensação de não se pertencer a este lugar. Foi terrível, no início! Não perceber porque riam as pessoas, porque estavam tristes, porque se zangavam... Falavam uma língua que eu não entendia.

Foi neste livro que encontrei por escrito sensações e sentimentos em relação à língua alemã. Quer dizer, não é propriamente em relação ao alemão, em si... Agora o entendo. É em relação a qualquer língua que não se saiba, não se domine.
Emmanuelle escreve:
"As pessoas dizem-me: "Fala, fala, nós compreendemos."
"A necessidade de estarmos juntos, de falar entre nós. De recuperar não só tempo perdido durante o dia com os que ouvem, mas a nossa língua, a nossa identidade."
"Não precisar de me estafar na tentativa de falar oralmente. Reencontrar as mãos, o à-vontade, os gestos que voam, que falam sem esforço, sem constrangimento (...) De súbito desaparecem as frustrações."

Numa destas noites, eu e Judit (colega do curso de alemão, de Barcelona), num pub em Repperbahn, esperávamos pela nossa vez de jogar matraquilhos quando conhecemos dois tugas. Percebi logo que o eram pois falavam entre si português. Mas como eu e Judit comunicávamos em alemão (para treinar) os tugas não se aperceberam que eu era também tuguinha. Nisto, antes que se entusiasmassem com alguns comentários, deixei-me identificar, e disse-lhes "Boa noite!". Resposta do tuga mais pequenito: "Boa noite! Então é portuguesa! Não dissemos nada de mal, ou dissemos?" :) Conversa puxa conversa, o mais pequeno comenta que falo muito bem alemão, para quem cá está apenas há ano e meio. E que ele nunca aprendeu alemão. Não precisa, diz.
O tempo passa, eu e a Judit já jogámos um jogo e já voltámos a colocar nova moeda sobre a mesa de matraquilhos para uma desforra. Volto para a conversa em português, e claro que surge a pergunta: "E então? Porque estás cá?". Lá respondo que tinha vontade de viver outras coisas, ganhar experiência numa empresa alemã, para depois voltar para Portugal. Novamente o mais pequeno diz: "Ohm... Eu queria juntar dinheiro, e por isso vim para cá há 10 anos. Eu vou vendo os meus colegas a pedirem-me para fazer os turnos deles. E eu lá vou dizendo que sim. Ganho mais uns trocos, claro. Mas... Por vezes penso: para quê?. Mas eles tem namoradas e isso. Eu não tenho. E para que quero eu fazer tanto turno?". Nisto, o tuga maior, interrompe-o: "Depende do que queres da tua vida! Eu sei o que quero. Quero poder comprar uma terra no Alentejo (é que eu sou de lá), poder construir uma casita, e viver por lá. Entretido. Com a minha família, claro! Para isso tenho de trabalhar! Ganhá-lo!". :) Nisto penso: ainda "existem"... Foi interessante ter aquela conversa, em que se dá o choque de mentalidades. Parecia que o mais pequeno queria "acordar" do sono anestesiante de emigrante que vem para a Alemanha trabalhar que nem maluco para ter dinheiro. Por pouco pensei que ele iria consegui-lo.

Viver aqui fez-me ver o Emigrante português de outra forma. Tenho bastante respeito por todos eles, na verdade. Arrumaram a trouxa e vieram para um país onde não conseguiam falar a língua, comunicar. E desenrascaram-se! Mas, quantos não devem sentir a frustração de tentarem comunicar-se com pessoas que falam alemão, e não conseguirem? Porque não aprenderam... Eu pude aprender alemão. Mas a maior parte dos que vem para cá, não vêm para aprender alemão! Vem para ganhar dinheiro! Não podem tirar simplesmente 6 meses para tirarem um curso intensivo de alemão, como eu fiz. E acabam por se deixar estar no seu cantinho, no cantinho que os faz sentirem-se seguros, no cantinho onde estão outros como eles, no cantinho português. Entendo-os. Compreendo-os.
A falta de comunicação entre comunidades (sejam elas de que nacionalidade for) é uma prisão. De onde é complicado de sair pois leva tempo! Ainda hoje me sinto frustrada quando não percebo tudo o que me dizem, principalmente se estamos em grupo e de repente todos se riem, e eu... Também! Para não perceberam que perceber a piada, não percebi!
Mas o caminho para um ambiente saudável numa sociedade, é mesmo conseguir-se comunicar. Aprender a língua do país que nos acolhe. No fim, é uma troca de interesses. Nós somos a mão-de-obra barata de que a Alemanha precisa. E eles são quem nos dá a oportunidade de sonhar com um futuro melhor. Mas nada disto é possível se não houver comunicação.
E depois de ultrapassados todos os obstáculos inerentes a tal "prisão", barreira, é espantoso! Passa-se a poder absorver tudo à nossa volta! A cultura de um país é interessantíssimo de se entender. Perceber porque é que as coisas se tornaram da maneira que se tornaram. Perceber porque é diferente do nosso país. Percebermos, principalmente, como "nós" somos... Afinal, quem somos nós? O que somos?

São várias as sensações que tenho ao estar longe de casa (Pt). É perguntar-me "mas que estou eu a fazer na Alemanha?", e ao mesmo tempo, "E o que haverá para além da Alemanha?". É sentir-se a saudade da maresia do Atlântico, e ao mesmo tempo, "haverá maresia no Pacífico?". São cócegas. É um bicho. É um bichito que vive dentro de mim e que quer saber tudo, absorver tudo.
Mary, a minha amiga colombiana, disse-me uma vez: "Vocês portugueses, são como os alemães. Querem ir para outros países para conhecer como vivem, como é a cultura, e depois partem. Porque o vosso lar será sempre a vossa terra". Será?

3 comentários:

  1. Os portugueses são aqueles que deram novos mundos ao mundo, nas palavras do Poeta :)
    Acredito que o meu lar seja sempre onde eu estiver, seja em casa arrendada, comprada, em Portugal ou na China.
    Mas saber quem somos, qual é a nossa terra, quais as nossas raízes, ajuda-nos a situar estejamos nós onde estivermos. Isto,pelo menos, é o que eu sinto;)

    Beijinhos e Boa Semana,

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  2. Há muitos emigrante que merecem o nosso respeito e admiracao, mas muitos, imensos, chegaram a estas terras e estancaram na comunidade portuguesa. Eu diria até que a grande maioria nao soube aproveitar a opurtunidade de aprender uma nova língua, costumes e um pouco mais de civismo.
    Outro dia estive numa festa de portugueses em HH e observei os "nossos" emigrantes: o mais importante é ostentar riqueza, mas apenas material.

    O nosso lar é onde estiver a nossa felicidade! Inicialmente sempre dentro de nós e depois espalhada pelos lugares por onde passamos!

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  3. :D Mas nao podemos de todo generalizar. Há emigrantes e emigrantes...
    Ok. E sim, existem Aqueles Emigrantes que parecem ter parado completamente no tempo. Hás-de ir à pastelaria portuguesa perto de HbH Süd (ou norte? hmm... não do lado de Spitalerstrasse) lá por volta das 13h15, aos Domingos, depois da missa :D

    p.s.: Atenção, que eu não costumo faltar a um galão e uma torrada nesta pastelaria ao Domingo! Já é tradição... Mas sobre esta pastelaria ficava aqui a manhã toda a falar sobre ela. Gosto muito. É onde eu mato as saudades (pelo menos algumas).

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