Portugal continua a dar o seu melhor, mesmo que seja por caminhos menos visíveis. Aqui fica o artigo na integra, escrito por Ana Rita Faria, sobre a empresa conimbricense, Black Box:
(para quem prefere ler on-line, procurar pelo Caderno P2 na barra da esquerda e ir até às páginas 6 e 7).
"A arte de mostrar o que ainda não existe"
08.07.2009, Ana Rita Faria
Escolhida no meio de 800 candidatos, a Black Box é a única empresa portuguesa nomeada para os prémios da visualização 3D na arquitectura. Hoje, sabe se fica entre os melhores
Tudo o que precisam é de computadores, de câmaras de filmar e de muitas, muitas fotografias. Por vezes um helicóptero também dá jeito, para obter imagens aéreas do local onde irá existir um empreendimento, um hotel de cinco estrelas ou até uma cidade inteira. E, talvez o mais fundamental de tudo, sensibilidade de arquitecto.
Formados em Arquitectura, os donos da Black Box criam imagens e filmes tridimensionais a partir de projectos tão diferentes como um Instituto de Comunicação Social para Angola, uma agência bancária para a Argélia, espaços públicos na Irlanda, uma cidade na Arábia Saudita, uma biblioteca em Barcelona ou uma torre de telecomunicações em Marrocos.
Mas foi a partir de Portugal, com o empreendimento turístico-residencial Douro 41 da Bascol e do Grupo Lágrimas que Miguel Miraldo, Joana Couto e Ricardo Silva conquistaram um lugar entre os cinco nomeados para os Architectural 3D Awards, na categoria de melhor imagem de arquitectura de interiores.
O trabalho sobre o empreedimento à beira do rio Douro tomou-lhes meio ano de trabalho, implicou várias visitas ao local e mais de 50 fotografias tiradas. Os quartos, salas e demais espaços do empreendimento foram mobilados ao gosto dos sócios. Os reflexos de luz nas imagens foram estudados ao pormenor e a vista das janelas para o exterior teve de reproduzir com exactidão os socalcos das margens do Douro, a vegetação e o rio.
O esforço recompensou e tornou a Black Box a única empresa portuguesa nomeada para o concurso que, desde 2004, premeia as melhores produções 3D na arquitectura a nível internacional.Organizado pela CGarchitect, revista online especializada na área, este prémio tem no júri representantes dos principais estúdios de visualização 3D mundiais.
A final realiza-se hoje em La Coruña, Espanha, e quer esta empresa de Coimbra ganhe ou não, "o mais importante é o reconhecimento internacional obtido com a nomeação", explica Joana Couto, de 32 anos. Tal como Miguel Miraldo, também de 32 anos, e Ricardo Silva, de 33, Joana Couto é formada em Arquitectura e cedo percebeu que tinha de encontrar uma alternativa profissional para fugir à saturação do seu mercado de trabalho.
Depois de passarem pelo gabinete de arquitectos como João Mendes Ribeiro e Jordi Badia, os três sócios (que foram colegas de escola no secundário, em Coimbra) decidiram lançar um projecto comum, a Black Box. Miguel e Joana foram os fundadores, em 2003, e Ricardo Silva juntou-se a eles um ano depois, como responsável pelo gabinete da empresa em Barcelona. Ao longo dos anos conquistaram clientes e projectos variados um pouco por todo o mundo.
Hoje, tanto podem fazer vídeos ou imagens de edifícios, empreendimentos ou outro tipo de espaços para imobiliárias e construtoras como recebem encomendas para produzir visualizações para gabinetes de arquitectos que estão a concorrer a um concurso de arquitectura. E, apesar de a crise ter posto um travão no mercado da construção, a Black Box tem-se mantido imune aos ventos desfavoráveis. "Como há quebra de vendas, também há necessidade de publicitar mais e o 3D é fundamental para isso", realça Joana Couto.
O primado da qualidade
Para os clientes da Black Box, a grande vantagem de recorrer ao trabalho da empresa é "começar a fazer publicidade e a vender um projecto antes de estar pronto, com base na imagem do que vai ser", explica a arquitecta. Por outro lado, a visualização 3D de um determinado espaço ajuda também a captar capitais para a própria construção, pois convence mais facilmente os investidores e permite fazer vendas antecipadas.
Além de construtores, imobiliárias e gabinetes de arquitectura, a Black Box já realizou também vários projectos para câmaras municipais. O último foi há dois meses, para a autarquia da Régua, e consistia num vídeo sobre um projecto de requalificação urbana. Mas este tipo de trabalho tem tido mais pedidos por parte do país vizinho. "Em Espanha, o poder local é muito forte e, se houver um projecto camarário que não tenha a aprovação da população, simplesmente não vai para a frente", conta Joana Couto.
Com quatro projectos em média por mês e uma facturação mensal de cerca de 15 mil euros, a equipa de seis pessoas da Black Box (quatro em Coimbra e duas em Barcelona) faz projectos para todos os bolsos, podendo ganhar 900 euros ou 20 a 30 mil num só trabalho. Contudo, Miguel e Joana admitem que os lucros poderiam ser bem maiores se fizessem um outro tipo de trabalho. "A maior parte das empresas da nossa área têm um produto-tipo para aplicar a todos os projectos, mas depois parece tudo igual, quer se trate de um hotel, de uma moradia ou um supermercado", destaca Miguel Miraldo.
Para os sócios da Black Box, o mercado, sobretudo ao nível dos gabinetes de arquitectura, exige um contributo que vai muito para além de pegar numa câmara, tirar umas fotos e modelar tudo no computador. "Estamos a mexer com o bebé dos arquitectos, o seu projecto, o que não é fácil, mas tentamos sempre interpretá-lo e dar um ou outro pormenor que revele o ambiente do espaço que vai nascer", explica Joana Couto. Um esforço que implica limitar a quantidade de trabalhos em agenda.
"Uma das coisas que distinguem a Black Box é não fazer muitos trabalhos, para tentar conseguir a maior qualidade possível em cada um deles", adianta.
O sonho adiado
Numa altura em que o recurso à tecnologia 3D na arquitectura é cada vez maior, a Black Box sabe que é na evolução constante que reside o segredo do sucesso. "Quando criámos a empresa, em 2003, houve um boom de empresas do ramo, mas agora começa a evoluir-se para outro tipo de tecnologias", afirma Miguel Miraldo.
O arquitecto prevê que, em breve, as empresas de visualização tridimensional comecem a recorrer aos óculos 3D, à semelhança do que tem acontecido no cinema, e que invistam nos ambientes de realidade virtual, tirados dos jogos de computador. Isso obrigará as empresas a criar espaços virtuais com os quais as pessoas possam interagir através de um ecrã de computador, abrindo e fechando portas, mudando os móveis de um apartamento ou as cores das paredes.
Paralelamente, a Black Box quer também aumentar o seu investimento no mercado da publicidade, onde tem já como clientes algumas empresas da indústria cerâmica, para as quais faz visualizações de produtos para catálogos. "O mercado de trabalho está a ir no sentido de uma crescente diversificação", realça Joana Couto. De fora parece ficar apenas o trabalho de arquitectura propriamente dito, embora os dois sócios reconheçam que sentem falta de exercer a profissão para que estudaram.
"Quando criámos a Black Box, a ideia era fazer 3D e arquitectura, mas acabámos por ter quase só trabalho de visualização", revela Miguel Miraldo. Os dois sócios reconhecem que o mercado de arquitectura continua "completamente saturado", além de estar a iniciar uma mudança profunda: a especialização. "Em Espanha, já há gabinetes de arquitectura que só trabalham na fase de projecto, outros que fazem controlo de obra e outros que executam, mas em Portugal os arquitectos ainda tentam controlar todo o processo", revela Joana Couto.
A vontade de voltar a assinar projectos mantém-se viva, mas a consciência de que essa actividade não pagaria um salário nem daria para viver transforma a arquitectura num sonho adiado para os donos da Black Box. Para já, interessa serem os melhores e verem isso reconhecido a nível internacional. Quem sabe, mais tarde, não se abram outras portas...
quarta-feira, 8 de julho de 2009
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Só é pena que o artigo se esqueça, não sei porque carga de água, de um dos fundadores: Pedro Vizeu. :s
ResponderEliminarDe resto, é um excelente exemplo de como se podem fazer grandes coisas em Portugal.
Pois é pena, mas o nome do Arqto Pedro Vizeu foi mencionado na entrevista. Para quem nao sabe, após dada uma entrevista, os entrevistados nao voltam a ver o artigo a não ser quando publicado. Essa omissão não foi intencional por parte dos actuais socios da empresa até porque as relações sempre foram e continuam as melhores.
ResponderEliminarNem eu quis dizer o contrário, Joana. Só chamei a atenção desse ponto porque conheci o Pedro e vi o entusiasmo com que ele falava da Black Box.
ResponderEliminarTalvez fosse boa ideia chamarem a atenção à jornalista, porque, da parte dela, é indubitavelmente uma omissão grave, mais ainda quando o nome do Pedro foi referido por vocês.
Just my two cents... ;)